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Artigo Original, Biomed Biopharm Res., 2023; 20(2):14-27
doi: 10.19277/bbr.20.2.324; PDF bilingue [+]; html em inglês [EN]   

 

Padrões de hidratação e consumo de bebidas numa amostra de adultos seniores institucionalizados em Portugal 

Damião Clemente1, Diogo Sousa-Catita 2 , & Cíntia Ferreira-Pêgo 3  ✉️

1 - School of Sciences and Health Technologies, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Av. Campo Grande 376, 1749-024 Lisbon, Portugal

2 - Residências Montepio – Serviços de Saúde, SA, Rua Julieta Ferrão nº 10–5º, 1600-131 Lisboa, Portugal

3 -CBIOS – Universidade Lusófona’s Research Center for Biosciences & Health Technologies, Campo Grande 376, 1749-024 Lisboa, Portugal

 

Resumo

A água desempenha um papel importante em diversas funções do organismo, sendo fundamental para células, tecidos e órgãos. Está também diretamente relacionada com vários processos, desde a manutenção da temperatura corporal até à eliminação de compostos. Com o envelhecimento, a sensação de sede diminui, o que pode levar a um consumo hídrico inadequado, causando um maior risco de desidratação na população sénior. Esta desidratação pode ter consequências no seu estado clínico, potenciando o seu declínio físico e psíquico. O objetivo principal do presente trabalho consistiu em avaliar o consumo diário de líquidos provenientes de diferentes bebidas em indivíduos institucionalizados num conjunto de residências da zona de Lisboa. Foi desenvolvido um estudo quantitativo observacional transversal que incluiu uma amostra de 350 participantes, com entrevistas cara-a-cara. Utilizou-se uma versão adaptada de um questionário validado, desenhado especificamente para a avaliação de consumo de líquidos através de diferentes bebidas. Como resultado desta avaliação, observou-se que os indivíduos institucionalizados não consumiram uma quantidade total de líquidos suficiente de forma a cumprir as recomendações europeias adequadas ao seu sexo e grupo etário. No entanto, os participantes que receberam nutrição artificial atingiram um consumo diário de 1,5 litros de água.

Palavras-chave: Ingestão de fluidos, água, bebidas, idosos institucionalizados, recomendações da EFSA

Como Citar: Clemente, D. , Sousa-Catita, D., & Ferreira-Pêgo, C. (2023) Hydration Patterns and Beverage Consumption Among a Sample of Institutionalized senior adults in Portugal Biomedical and Biopharmaceutical Research, 20(2), 14-27.

Correspondência autor: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.
Recebido: 23/08/2023; Aceite: 7/12/2023

 

Introdução

A água é o maior componente do corpo humano (1) e está diretamente relacionada com várias funções vitais das células, tecidos e órgãos, tais como a regulação das funções, a manutenção da temperatura, a transferência de diferentes nutrientes e outros produtos e a eliminação de compostos resultantes do catabolismo (2). À medida que envelhecemos, a relação entre hidratação e saúde torna-se cada vez mais complexa, com nuances particulares que se manifestam na população idosa. Os avanços na nossa compreensão da hidratação em indivíduos idosos sublinham os desafios intrincados associados ao envelhecimento, uma vez que a hidratação é de extrema importância na população sénior e, consequentemente, a desidratação é um fator de risco para esta população (3). Esta desidratação podem ocorrer devido a uma perda da sensação de sede (4), mas também através de perdas como hemorragias, vómitos e diarreia (5). A dificuldade em manter a hidratação nos doentes idosos pode também dever-se a vários outros fatores, como dificuldades visuais, problemas de deglutição (disfagia), imobilização, ingestão de sedativos ou incontinência (3). A toma de diuréticos ou outros tipos de medicação pode também ser um fator agravante, uma vez que provocam a perda de fluidos corporais (5). Esta condição pode levar à presença de dores de cabeça, xerostomia, perda temporária de sensibilidade e movimento, fadiga, fraqueza muscular, tonturas e, em casos mais graves, pode causar hipotensão, taquicardia ou perda de consciência e até mesmo a morte (6). A baixa ingestão de líquidos está também associada ao agravamento de patologias associadas pré-existentes e consequente diminuição da qualidade de vida (1). A desidratação pode ser classificada de 3 formas diferentes: a) isotónica, a mais comum, em que a perda de água e iões são equivalentes; b) hipertónica, uma maior perda de água em relação aos iões; e c) hipotónica, uma maior perda de iões em relação à água (7).

A Agência Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) recomenda uma ingestão diária de água proveniente de alimentos e bebidas para adultos e idosos do sexo masculino de 2 litros e do sexo feminino de 1,5 litros. A EFSA recomenda o consumo de líquidos de 1.5 litros para homens e 1 litro para mulheres (8). No entanto, estas recomendações não têm em consideração as condições de saúde ou doença do adulto mais velho. A Sociedade Europeia de Nutrição Clínica e Metabolismo (ESPEN), por sua vez, indica que todos os indivíduos idosos que entram numa unidade de saúde devem ser imediatamente considerados em risco de desidratação e aconselhados a consumir pelo menos 1,6 litros de líquidos (9).

Os indivíduos mais velhos e os residentes em estabelecimentos de cuidados prolongados, que incluem cuidados residenciais, cuidados de enfermagem de longa duração e unidades de cuidados de demência, enfrentam uma maior suscetibilidade à desidratação. Esta vulnerabilidade resulta de uma maior probabilidade de deficiências cognitivas e físicas, que dificultam a sua capacidade de recordar e aceder a bebidas. Uma revisão sistemática publicada em 2015 (10) identificou várias intervenções de forma a tentar reduzir a desidratação em idosos institucionalizados. No entanto, a eficácia de numerosas estratégias permanece incerta devido ao risco de viés prevalecente em muitos estudos. É provável que a atenuação da prevalência da desidratação nas instalações de cuidados prolongados seja conseguida através de abordagens multifacetadas que envolvam os decisores políticos, a gestão e o pessoal que presta cuidados. No entanto, é imperativo efetuar uma exploração mais abrangente, utilizando metodologias de estudo robustas, para comprovar a eficácia destas estratégias.

Para responder à necessidade premente de uma base de evidência reforçada neste domínio, o nosso estudo investiga a avaliação do consumo diário de líquidos de diferentes tipos de bebidas em indivíduos institucionalizados em residências na área de Lisboa. Esta investigação pretende contribuir para a compreensão dos padrões do consumo de água e bebidas neste grupo demográfico específico, colmatando as lacunas existentes no atual estado da arte. Ao fazê-lo, a nossa investigação pretende impulsionar o discurso sobre estratégias ótimas de gestão de fluidos, promovendo assim o bem-estar e a longevidade da população idosa.

Material e Métodos

Desenho e população do estudo

O presente trabalho consistiu num estudo observacional transversal quantitativo. Foi realizado num Grupo de Residências Sénior constituído por quatro unidades na Área Metropolitana de Lisboa. A amostra total foi constituída por 350 participantes de ambos os sexos. A duração do internamento variou consoante a tipologia associada e as necessidades de reabilitação do indivíduo. As tipologias de internamento nestas residências são: convalescença (permanência institucionalizada durante 30 dias), média duração e reabilitação (permanência durante 60 dias), longa duração e manutenção (permanência durante 90 dias) e institucionalizado particular (duração variável de institucionalização).

Dados Antropométricos

Cada individuo foi pesado numa balança automática, caso conseguisse manter a posição ortostática. Foram também efetuadas medições do perímetro braquial e da cintura com recurso a uma fita métrica. Caso existissem limitações de mobilidade, as medidas antropométricas foram recolhidas em base nas avaliações efetuadas anteriormente nestas instituições. Estas medidas, através da fórmula de Rabito (11), permitiram estimar o peso corporal aproximado dos doentes que não puderam ser pesados.

No entanto, era importante verificar se o doente apresentava aumento de tecidos moles nos membros superiores e/ou inferiores, uma vez que esta alteração pode levar a erros nos valores medidos (sobrestimação do peso devido a edema) e, assim, fornecer dados incorretos que condicionariam o tratamento e a evolução do doente.

Consumo de líquidos

Posteriormente, os participantes foram inquiridos sobre os seus hábitos de consumo de líquidos através da adaptação de um questionário previamente validado (12). O questionário foi adaptado para a língua portuguesa e apenas para as bebidas disponíveis na instituição, tendo sido aplicado pelo Nutricionista da instituição, em entrevistas pessoais e individuais. Foi registada a média de água presente nos suplementos de nutrição entérica ou parentérica disponíveis nas unidades, bem como os sacos de água de 500 ml fornecidos aos doentes com nutrição artificial. Os doentes com dificuldades de comunicação ou com alguma patologia que afetasse a sua memória/cognição não foram inquiridos devido à possibilidade de falta de fiabilidade da informação obtida. No entanto, para estes doentes, foi solicitado aos familiares que disponibilizassem estes dados.

Ética

O trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética da Escola de Ciências e Tecnologias da Saúde da Universidade Lusófona (P13-22). Os participantes incluídos aceitaram participar de livre vontade e responderam às questões de forma presencial após assinarem o consentimento informado. No caso dos doentes com patologias que afetam a memória/cognição, foi solicitado o consentimento informado assinado pelos familiares/responsáveis.

Análise estatística

A análise estatística do presente estudo foi efetuada com recurso ao programa de análise estatística IBM® SPSS® Statistics para Windows, Versão 28.0 (IBM Corp., Armonk, NY, EUA). O Índice de Massa Corporal (IMC) foi calculado de acordo com as normas internacionais já estabelecidas (13) tendo em consideração a fórmula: Peso[kg]/Estatura2[m]. A idade foi categorizada em 2 categorias (<65 vs. >65 anos) para comparações entre grupos de idade. A normalidade das variáveis foi previamente testada e, uma vez que seguiram uma distribuição normal, foram utilizados testes paramétricos. A distribuição das variáveis foi analisada através de ANOVA ou teste t-student, conforme apropriado. Os resultados foram apresentados como médias (desvio padrão, DP). As diferenças significativas foram consideradas como um valor de p<0,05.

Resultados

O consumo total e as diferentes bebidas ingeridas pelos 350 indivíduos institucionalizados foi analisado. Na Tabela 1 é possível observar as características gerais da amostra total do estudo, que incluiu 155 (44,2%) homens e 195 (66,8%) mulheres. A média de idade foi de 76,7 ± 12,28 anos. O IMC da amostra foi de 23,90 ± 5,90 kg/m2. A idade foi a única variável que apresentou diferenças significativas (p<0,001) entre as tipologias de internamento, sendo os doentes do sector privado mais velhos do que os restantes grupos analisados. 

Tabela 1 - Caraterização da amostra de acordo com a tipologia de institucionalização.
bbr.20.2.324.Tab1
IMC: índice de massa corporal. Comparações foram feita com testes ANOVA, ou teste t de student, conforme apropriado com nível de significância de p<0,05.

 

Em relação ao consumo de líquidos de acordo com a tipologia de internamento, verificou-se um consumo médio diário de água (corrente e engarrafada) entre 362,31 e 630,31 ml. Os convalescentes consumiram 1160,61 ml, os de média duração 900,00 ml, os de longa duração 623,19 ml e os privados 1089,24 ml de ingestão diária total de líquidos. O consumo de água, água engarrafada, sopa, chá sem açúcar, chá com açúcar e o consumo total apresentaram diferenças significativas entre os grupos analisados. Os doentes em convalescença apresentaram maior consumo de água, sopa e consumo total diário. Para água engarrafada e chá (com e sem) açúcar, os convalescentes apresentaram maior consumo (Tabela 2).

Tabela 2 - Consumo de líquidos de acordo com a tipologia de institucionalização.
bbr.20.2.324.Tab2
Comparações foram feitos testes ANOVA, com nível de significância de p<0,05. Dados expressos em média (DP).

 

Análises em função do sexo foram também realizadas, e foi observado que a idade, o peso, a estatura e o IMC apresentaram diferenças significativas entre os sexos, sendo os homens mais altos e mais pesados do que as mulheres. Por outro lado, o sexo feminino era mais velho e apresentava valores de IMC mais elevados. Essas características gerais de acordo com o sexo podem ser observadas na Tabela 3. Adicionalmente, as mulheres apresentaram uma ingestão diária total de 969,24 ml e os homens de 970,34 ml, dos quais 559,9 ml e 512,26 ml foram através do consumo de água (da torneira e engarrafada), respetivamente. Os homens apresentaram um consumo significativamente maior de sumos de fruta em relação às mulheres (Tabela 4).

Tabela 3 - Caraterização da amostra de acordo com o sexo.
bbr.20.2.324.Tab3
IMC: índice de massa corporal. Comparações foram feitas com testes ANOVA, com um nível de significância de p<0,05.

 

Tabela 4 - Consumo de líquidos de acordo com o sexo.
bbr.20.2.324.Tab4
Comparações foram feita com testes ANOVA, com nível de significância de p<0,05. Dados expressos em média (DP).

 

A Tabela 5 mostra o consumo total diário de líquidos de acordo com as categorias de idade (<65 vs. >65 anos). O grupo mais jovem apresentou um consumo total de líquidos de 1086,67 ml, enquanto o grupo mais sénior apresentou uma ingestão de 945,53 ml, dos quais 563,33 ml e 531,03 ml foram através de água (da torneira e engarrafada), respetivamente. A água engarrafada, o sumo de fruta e a ingestão total de líquidos apresentaram diferenças significativas entre os grupos analisados, apresentando o grupo mais jovem um maior consumo destes três tipos de bebidas.

Tabela 5 - Consumo médio de líquidos por categoria de idade.
bbr.20.2.324.Tab5
Comparações foram feita com testes ANOVA, com nível de significância de p<0,05. Dados expressos em média (DP).

 

Em relação ao consumo de líquidos de acordo com as categorias de IMC, foi encontrado que os indivíduos com baixo peso apresentaram uma média de ingestão total de líquidos de 844,44 ml, os com peso adequado para a sua estatura consumiram 972,04 ml e os com excesso de peso 1237,56 ml (Tabela 6). Relativamente à água (da torneira e engarrafada), verificou-se um consumo de 479,01 ml nos indivíduos com baixo peso, 533,9 ml nos indivíduos com peso normal e 687,5 ml nos indivíduos com excesso de peso. A água engarrafada, a sopa e a ingestão total de líquidos apresentaram diferenças significativas, sendo que os participantes com excesso de peso apresentaram um maior consumo destes três tipos de bebidas.

Tabela 6 - Consumo de líquidos de acordo com as categorias de IMC.
bbr.20.2.324.Tab6
IMC: índice de massa corporal. Comparações foram feitas com testes ANOVA, com um nível de significância de p<0,05. Dados expressos em média (DP)

 

Finalmente, do total da amostra, 44 indivíduos receberam alimentação artificial (Tabela 7), seja por sonda nasogástrica ou gastrostomia endoscópica percutânea (PEG). Verificou-se que os indivíduos recebiam um total de dois sacos de água, cada um com 500 ml, para além da alimentação por suplementação entérica ou parentérica.

Tabela 7 - Consumo de líquidos de pacientes com nutrição artificial.
bbr.20.2.324.Tab7
Dados expressos em média.

 

Discussão

Os dados recolhidos no presente estudo indicam que a população institucionalizada analisada apresentou um consumo diário de líquidos baixo em ambos os sexos, apresentando o sexo feminino um consumo médio de 969,24 ml e o sexo masculino 970,34 ml, dos quais 559,9 ml e 512,26 ml através do consumo de água, respetivamente. Assim, observa-se que, de uma forma geral, a amostra analisada não cumpriu com as recomendações europeias para as suas faixas etárias e sexo, uma vez que as recomendações da EFSA para adultos geriátricos, em termos de consumo exclusivo de líquidos, indicam que o género feminino deve ter a ingestão de 1000 ml e o género masculino 1500 ml (8).

Os presentes resultados foram também ao encontro do Inquérito Alimentar Nacional e de Atividade Física (IAN-AF) para os anos de 2015 e 2016, onde foi possível verificar que a população portuguesa consumia habitualmente menos de 1000 ml de água diário, sendo que os adultos apresentavam um consumo médio de 956 ml/dia e a população sénior 780,1 ml/dia (14). Numa outra instituição sénior Portuguesa foi também avaliado o consumo diário de água e outros líquidos, e foi reportado que 36% bebiam em média pelo menos 1000 ml de água (15). Estes resultados parecem significar que o consumo apresentado pelos participantes institucionalizados avaliados no presente estudos parecem ser semelhantes, tendo sido observado um consumo médio de 969,73 ml.

A diminuição da mobilidade, bem como a presença de várias patologias, estão associadas a uma menor vontade de beber água e hipodipsia (16). Os resultados observados parecem confirmar este facto, uma vez que os convalescentes (internamento de apenas 30 dias devido a uma perda temporária de autonomia) apresentaram um maior consumo total de líquidos. Vários podem ser os fatores que influenciam a baixa ingestão de líquidos por indivíduos idosos, principalmente quando institucionalizados. Um desses fatores pode estar relacionado ao medo de urinar com maior frequência, especialmente também relacionado à presença de dificuldades de locomoção (17). No presente estudo, observou-se que o grupo de participantes mais velhos apresentou uma menor ingestão de líquidos em comparação com os adultos mais jovens. O IMC, o rácio metabólico e a área de superfície corporal têm um impacto na diferenciação entre indivíduos obesos e não obesos no que diz respeito ao consumo de água, sendo que os indivíduos obesos têm um consumo mais elevado (18). Num estudo realizado nos Estados Unidos da América, os autores concluíram que parecia existir uma relação entre o aumento do peso corporal e a diminuição do consumo de água (19). No entanto, no presente estudo, verificou-se o contrário. No contexto de indivíduos institucionalizados e recebendo nutrição artificial, a nossa investigação revelou um consumo médio de líquidos de 1700 ml. A ingestão adequada de líquidos é vital para o suporte nutricional essencial, e as diretrizes estabelecidas sugerem um intervalo de 30 a 45 ml por quilograma de peso corporal. Tendo em consideração o peso médio dos indivíduos do nosso estudo, o consumo de líquidos recomendado deveria situar-se idealmente entre 1773 e 1989 ml. No entanto, os nossos resultados indicam que os indivíduos não atingiram a ingestão de líquidos recomendada de acordo com estas recomendações. Uma ingestão inadequada de líquidos pode ter implicações profundas na saúde do doente, afetando potencialmente o estado de hidratação, a função renal e o bem-estar geral. Esta discrepância entre a ingestão de líquidos observada e a recomendada levanta preocupações sobre os cuidados nutricionais prestados a doentes institucionalizados que dependem de nutrição artificial. Vários estudos têm enfatizado a importância de cumprir os requisitos nutricionais prescritos, incluindo a ingestão de líquidos, para otimizar os resultados de saúde nesta população vulnerável (23, 24). Por conseguinte, os nossos resultados não só sublinham a lacuna existente na gestão de fluidos para estes doentes, como também realçam a necessidade dos prestadores de cuidados de saúde adaptarem o apoio nutricional de forma mais próxima às indicações estabelecidas. Algumas das estratégias aplicadas para aumentar a ingestão de líquidos na instituição estudada incluíram a melhoria da interação com os doentes, aumentando a sua literacia sobre a importância da ingestão de líquidos. Esta disponibilização de informação científica adequada à população em estudo permitiu que esta aprendesse formas úteis de se hidratar, bem como quais as consequências a curto e longo prazo de uma ingestão deficiente. É importante referir que já tinham sido distribuídos cartazes e panfletos em diferentes unidades, no âmbito de uma ação de educação para a saúde dirigida aos doentes institucionalizados. Outra estratégia implementada consistiu em encher os copos ou garrafas dos doentes e colocá-los em locais de fácil acesso, facilitando o aumento da ingestão de líquidos em diversas situações. Embora se reconheça a eficácia destas estratégias, futuras intervenções deverão ser realizadas no sentido de reforçar a literacia nutricional dos participantes institucionalizados e dos profissionais de saúde responsáveis pelo seu bem-estar, com particular ênfase na importância do consumo adequado de líquidos. É importante referir que uma limitação do estudo pode estar relacionada com o viés de memória no fornecimento da informação, além do facto de ter sido utilizado um questionário originalmente escrito numa língua não portuguesa e não validado à realidade da amostra em estudo. Também o desenho transversal do estudo, não permite estabelecer uma relação causa-efeito. Os pontos fortes deste estudo são demonstrados pela recolha exaustiva de dados envolvendo doentes de diferentes tipos de cuidados e unidades, bem como a avaliação exaustiva da ingestão de líquidos entre os doentes que recebem nutrição entérica.

Conclusões

Os indivíduos institucionalizados nas residências privadas analisadas da Área Metropolitana de Lisboa não cumpriram, de um modo geral, as recomendações europeias para a ingestão de água, de acordo com os seus grupos etários e sexo. No entanto, os participantes que recebiam alimentação artificial estiveram mais próximos destas recomendações.

Declaração sobre as contribuições do autor

D.S.-C.; C.F.-P., conceção e desenho do estudo; D.S.-C.; D.C., implementação experimental; D.C.; C.F.-P., análise de dados; D.C., redação, edição e revisão; D.C.; C.F.-P., figuras e gráficos; D.S.-C.; C.F.-P., supervisão e redação final. Todos os autores leram e concordaram com a versão publicada do manuscrito.

Financiamento

Esta investigação foi financiada por fundos nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e Tecnologia, I.P. (Portugal), no âmbito dos projetos DOI 10.54499/UIDB/04567/2020 e DOI 10.54499/UIDP/04567/2020. C.F-P. é financiada pelo contrato de Estímulo ao Emprego Científico da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P. (Portugal) [número de referência DOI 10.54499/CEECINST/00147/2018/CP1498/CT0009).

Agradecimentos

Os autores agradecem a todos os participantes, e às instituições pela colaboração na recolha de dados.

Conflito de Interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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